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Quando comecei a escrever este livro, pensava escrever sobre os episódios bons e maus,
curiosos ou divertidos, importantes e marcantes da minha longa vida de editor ( sessenta e oito anos). Mas com o tempo saltaram à minha memória, e aos meus dedos, algumas cenas que nada têm a ver com a minha vida de editor mas sim com ela globalmente. Alguns textos revelam a minha trajetória editorial, outros apenas algo da minha vidinha.
Há 97 anos nasci em Lisboa em Campo de Ourique, sou o quarto filho de cinco irmãos. Desde jovem por amor à natureza e à vida ao ar livre, dediquei-me ao campismo com entusiasmo, e escrevi aos 22 anos, em 1946, O Campismo na Vida Moderna, editado pela Biblioteca Cosmos. Portanto há 75 anos.
Na Poeira do Tempo não é uma autobiografia, mas sim um livro de memórias apresentadas sob a forma de crónicas. O meu percurso foi moldado pela minha paixão por livros, por viagens e pela vida, num emaranhado do qual emergem hoje cenas marcantes para mim. As recordações são como as nuvens, aparecem subitamente num céu límpido, avolumam-se, por vezes desfazem-se em chuvas, outras somem na profundeza azul do céu. Nem umas nem outras respeitam previsões antecipadas, aparecem e desaparecem a seu bel prazer. O que está escrito, são apenas umas páginas soltas, crónicas de episódios da minha vida, adulteradas, involuntariamente ou não, pela ação mágica do filtro do nosso ego e da nossa consciência.
Não posso dizer se a minha trajetória de vida, foi ou não, moldada por ter sido um contestatário político e emigrante. Após a faculdade de Agronomia ( em que cursei silvicultura) em 1949, em razão da minha militância antifascista no MUD Juvenil, emigrei para a Venezuela, depois para o Canadá até ir para o Brasil, aonde vivi cerca de 40 anos.
No Brasil com 29 anos(1953)publiquei como editor, na minha primeira editora, Andes, o primeiro livro A Verdade Sobre a Guerra da Coreia. No Brasil fui editor e proprietário da editora Fundo de Cultura, Páginas e Vértice.
De regresso a Portugal, criei em 1991, a Editora Pergaminho, Arte Plural e a Bico de Pena, e posteriormente a Vogais & Companhia. Editei ao longo de sessenta e oito anos mais de três mil títulos, milhões de exemplares. Em 2014 para comemorar os meus 90 anos criei a 4Estações Editora da qual sou o editor.
Em finais de 2008 e 2010, após a venda do grupo Pergaminho e Vogais & Cia., respetivamente, desfrutei de alguns anos sabáticos em viagens. Escrevi cinco títulos, O Escultor de Almas e O Contador de Estórias, editados pela 4Estações Editora. O Homem que Perdeu a Sombra, O Roxo dos Jacarandás e A Paixão dos Suicidas ainda no prelo. Três romances e dois livros de contos.
Os meus irmãos Rogério Moura e Rui Moura foram editores, Rogério com a Livros Horizonte e Rui com a editora Prelo.
Porém rolei como um seixo no leito de um rio de caudal forte. Talvez tenha sido isso que alisou a minha alma e a mente, de tal forma que agora revejo todos esses anos vividos, um a um, mês a mês, semana a semana, hora a hora, e acho que valeu a pena, que posso dizer, sem falsa modéstia, que plantei sonhos dos quais colhi os frutos.
Mário Mendes de Moura